terça-feira, janeiro 15, 2008

As flores I

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Estou sentado à mesa da sala, virado para a janela grande. À minha direita está, como sempre, a jarra. Desde sábado, uma braçada de rosas-chá marca o espaço.

Nunca consegui explicar porque é que as flores me fazem uma companhia tão fundamental. Numa introspecção superficial emerge, apaziguadora, a sensação de beleza. Subliminar a todo o meu “estar”. Este “estar” que, destituído desta presença cai, com demasiada naturalidade, na instabilidade e na melancolia. Quando, em maré de reflexão, me alheio dela (seja porque não as haja – o que é raro – seja por não as ver), é quase certo que me invade a nostalgia.

Volto-me então para a janela das traseiras que o sol não alcança. Mergulho naquela solidão absoluta que faz do silêncio o primeiro plano da realidade e da meditação essa serena viagem aos confins da alma. Como se o mundo se calasse e nos deixasse a sós com o nosso destino…
As flores são os antípodas disto. Ficam a sul. À luz forte do meio-dia. Restauram, com a serenidade das certezas, a alegria do viver. Filosoficamente estabelecem a precariedade definitiva da existência. Paradigma da dignidade da beleza perante a evidência de um desaparecimento tão próximo como inevitável…

Info-inabilidade

Quando retomei o “pensorápido” quase tudo o que autodidacticamente tinha aprendido com ele se me varrera. Ainda para mais, o modelo tinha, entretanto, sido alterado. Automaticamente apareciam alterações e actualizações que implicavam decisões assustadoras. Naveguei como pude e pareceu-me que tinha conseguido manter o essencial da imagem a que o associo. Subitamente o texto toma uma cor inesperada e ilegível que (há males que vêem por bem) desencadeia mais comentários que nunca na gente da minha geração (presumo) muito dependente da ajuda óptica…

Curiosamente verifico que o verde do fundo não agrada. De imediato não consigo prescindir dele. Mas prometo que vou ponderar. Há razões de(coração)… À laia de compensação e após um martírio de experimentação, consegui alterar a cor das letras dos textos das mensagens (é assim que agora se designam (e bem) os posts). Creio que está, pelo menos, legível.

sábado, janeiro 05, 2008

O salto


Este que aqui se vê, paralisado nesse tempo mágico que é o das fotografias, é Conrad Schumann, guarda-fronteira da RDA até brevíssimos instantes antes do disparo da câmara, neste 15 de Agosto de 1961. Dificilmente se percebe, mas a sua bota calca o arame farpado da barreira instalada dois dias antes sobre a linha, até então imaginária, que dividiu Berlim.

Sabe-se, porque o contou quem assistiu, que este jovem de dezanove anos andou todo o dia numa agitação tão evidente que chamou a atenção dos fotógrafos que por ali se mantinham. Um vai e vem nervoso até um ponto determinado da barreira onde baixava sistematicamente, em jeito pouco convincente de rectificação, a altura do arame farpado. No sítio exacto onde agora tem a bota.

Conrad está prestes a largar a arma, numa urgência de arrependido. Há dois dias que lhe queima a consciência. Quando ela tombar, no instante seguinte, terão caído por terra, também, as suas ilusões. O ideal cedeu ao real. A fé ao pragmatismo. Sabe, enfim, que escolheu o lado certo da vida.